Sobre

As aventuras de Zé Baldinho é um game "educativo" desenvolvido com o programa Arcade Game Studio (ARGS) de Bruno R. Marcos. O game propõe unir o conteúdo ambiental, social e contextualizador, a uma jogabilidade divertida e fluída. Quando pensamos em jogos eletrônicos com conteúdos ditos "educativos" geralmente nos remetemos a games pouco lapidados, de jogabilidade pouco fluída, e em geral chatos. A intenção aqui é unir diversão com conteúdos instrutivos.

Todo o contexto de criação deste game vem de 2 anos de atuação com o grupo de pesquisa "Arte e vida nos limites da representação", com projetos de pesquisa e extensão na comunidade do Chico mendes, junto com o projeto da Revolução dos Baldinhos, e o Coletivo Geodésica Cultural Itinerante, do qual faço parte, em Florianópolis, SC. O projeto da Revolução dos Baldinhos, que é da comunidade em parceria com a CEPAGRO, recolhe os resíduos orgânicos da comunidade destinando-os à produção de adubo. 

Inseridos neste contexto, partíamos, nós do grupo de pesquisam, da ideia de nunca criar representações apenas por criar, que elas não bastassem por si, mas que fossem fruto de ações que interferissem no real daquele contexto. Em outras palavras criamos imagens, mas elas eram consequências de ações, assim como sua formalização posterior gerava outras ações que geravam mais imagens (representações).

Nesta experiência não compartilhávamos com a comunidade apenas a execução das imagens, mas sim o ato criativo em sí. Ou seja, estas representações não eram apenas a nossa visão sobre a realidade, mas a visão das pessoas da comunidade que estavam envolvidas no projeto da Revolução dos Baldinhos.

Seguindo a partir desta lógica a atividade de construção de hortas verticais com pneus e materiais do lixo se transformaram em um campeonato de "virar pneus" (do avesso). Travar contato com as mulheres da revolução virou a construção compartilhada de um roteiro para um filme de animação, onde os ratos, o antigo problema da comunidade, viravam personagens lúdicos.

Levar as mulheres da revolução até a universidade (UDESC) virou oficinas de produção de esculturas, bonecos de ratos, de argila, moldes de gesso, que por sua vez viraram oficinas para a confecção de vasos e hortas verticais de cerâmica na comunidade. Instalar as hortas produzidas nas calçadas e pátios de casas na comunidade se transformou em um "Cortejo dos ratos", onde vestidos com fantasias de ratos, com instrumentos, ocorreu um momento mágico de alusão ao flautista de Hamelin, com quase 50 crianças seguindo o cortejo musical e aprendendo sobre as hortas e seus cuidados.

As imagens do cortejo viraram mostra de filmes, assim como uma HQ (história em quadrinhos), lúdica e narrativa, falando sobre a ação de instalar hortas, seus cuidados, e realizada como atividade de autoria compartilhada com os integrantes da revolução, para que sua voz estivesse nos balões de fala dos personagens (E essas atividades foram minha maior contribuição no projeto). Essas HQs foram editadas do forma caseira, e distribuídas em dois momentos seguintes, durante a instalação de mais hortas verticais na comunidade.

Alan Moore, autor da HQ (história em quadrinhos) Watchmen, Monstro do Pãntano, V de Vingança, entre outras, diz que quando criamos uma narrativa é preciso ir além dos personagens principais. É preciso criar todo o contexto no entorno dos personagens: suas relações sociais, como se vive, o que fazem, as relações de poder, etc, daquele universo onde se insere a narrativa. Bem, essa tarefa é encurtada quando crio os personagens e roteiro e argumento do game a partir de um contexto real, o qual eu experienciei como participante.

Além de tudo isso, entram também o meu repertório "gamístico", e uma vontade que vêm desde a infância em produzir meu próprio game.

A ideia para o personagem principal, Zé Baldinho, veio das bombonas azuis que recolhem o resíduo orgânico, assim como do personagem Rayman, do game homônimo, com seus braços e pés flutuantes. Este estilo de personagem precede o game, aparecendo em desenhos animados, e sabe-se lá onde antes disso. Eles me lembram também bonecos articulados e manipulados por cordas "invisíveis", do teatro de bonecos.

Outros games que me inspiraram foram: Earthworm Jim, por seu bom humor, lúdicidade e surrealismo, Battletoads, por seu level design criativo que varia a dinâmica e jogabilidade de cada estágio, e Cool Spot, também pelo seu humor e jogabilidade. Com certeza outras referências se fazem presente para além das que consigo enumerar.

Paulo Andrés de Matos Villalva.

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Um game Artesanal:

Proponho o termo "game artesanal" como uma alternativa ao “indie game” (ou game independente), muito usado para definir games produzidos com baixo orçamento, por equipes de poucas ou até uma pessoa apenas, geralmente com ferramentas acessíveis a qualquer pessoa na internet.

Por que chamar este jogo eletrônico que produzi de um game “artesanal”? Por que o artesão é aquele que o trabalho não o aliena de seu produto. Na produção de um game convencional as pessoas envolvidas não precisam entender do produto como um todo, mas apenas de partes muito específicas. Os trabalhadores que produzem o jogo são todos especialistas em alguma tarefa, mas nenhum deles poderia realizar o game sozinho. Por outro lado, o artesão é aquele que tem de conhecer o processo de produção do começo ao fim: da concepção até sua distribuição e comercialização.

O game-artesão tem de conhecer de games como um todo: sua narrativa, jogabilidade, sons, músicas, gráficos, como manter um blog para divulgação, etc. Esse tipo de produtor tem de estar imerso na pesquisa sobre o game, as ferramentas que tem a sua disposição, e as relações entre todas as partes que compõem o produto final. Não é uma questão de egocentrismo, de dispensar ajuda de outras pessoas, mas uma escolha por experimentar o processo como um todo. Sob o risco de se perder algo que cada especialista pudesse oferecer, penso ganhar no conjunto e unidade do game, pensado cada vez mais como uma forma de expressão estética.

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